Os ministros do STF iniciaram, há pouco, o julgamento do mérito da ADPF 54, ajuizada em 2004 pela CNTS. A entidade defende a descriminalização da antecipação terapêutica do parto em caso de gravidez de feto anencéfalo.
O ministro Marco Aurélio julgou procedente o pedido formulado na inicial, para declarar a inconstitucionalidade da interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencéfalo é conduta tipificada nos artigos 124, 126, 128, incisos I e II, do CP brasileiro. Veja com exclusividade o relatório e o voto do ministro.
Ele ressaltou que somente a mulher grávida de feto anencéfalo é capaz de mensurar o sofrimento a que se submete. Para o ministro atuar com sapiência e justiça, com base na CF/88 e sem qualquer dogma ou paradigma moral e religioso, gera a obrigação de "garantir, sim, o direito da mulher de manifestar-se livremente, sem o temor de tornar-se ré em eventual ação por crime de aborto".
Para a CNTS, obrigar a mulher a manter uma gravidez, ciente de que o feto não sobreviverá após o parto, fere o princípio constitucional da dignidade pessoa humana (artigo 1º, inciso III) e afeta o direito à saúde também previsto na Constituição (artigos 6º e 196). Outro argumento é o de que a antecipação terapêutica do parto não é vedada no ordenamento jurídico brasileiro, portanto, sua realização não pode ser proibida sob pena de ofensa ao princípio da legalidade (artigo 5º, inciso II, da CF).
Histórico
Ainda em 2004, o ministro Marco Aurélio concedeu liminar para autorizar a antecipação do parto quando a deformidade fosse identificada por meio de laudo médico. Porém, pouco mais de três meses após, o Plenário decidiu, por maioria de votos, cassar a autorização concedida. A discussão, bastante controvertida, foi tema de audiência pública em 2008, ocasião em que foram ouvidos representantes do governo, especialistas em genética, entidades religiosas e da sociedade civil.